Wal Reis

Crônica: Sobre essa gente que se acha a última bolacha do pacote

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Sabe aquele povinho que ocupa cargo importante e não responde e-mail para subalterno? Fica rico e passa a tratar mal o garçom? Sobe na caixinha de fósforos e jura que está no palco? Pois é. A batata deles está assando.

*Wal Reis

Algumas pessoas não precisam abrir a boca para termos certeza de quem são. Pelo jeito que respiram dá para identificar se tem um ser humano ali que vale a pena ou um que deveria ter ficado dentro da camisinha. Gente que por algum motivo – formação ou deformação – acredita piamente que está entre os escolhidos para a Terra Prometida e, neste caso, né? Perder tempo com os hereges para quê?

Nos escritórios, a espécie é abundante. Criam canais de comunicação com seus vários públicos, escrevem no perfil da rede social sobre a importância de interagir horizontalmente com os colaboradores e só abrem e-mail e WhatsApp do chefe. Se estão em um dia generoso até leem sua mensagem. Mas das seis perguntas que você fez, vão responder a primeira. E ainda terminam com “bom final de semana” em plena terça-feira, para que tenha certeza que a bondade de seu interlocutor terminou ali.

E se estiver fora dos portões da corporação, experimente vender seu peixe para aqueles CEOs que se acham a Rainha da Inglaterra. Você manda a mensagem pelo canal disponível no site mais ou menos assim: “cara Elizabeth II, sei que é você quem faz as compras de batata para sua empresa de batatas. E sabe o que tenho para lhe oferecer? Batatas! Vamos conversar?” E você fica no vácuo. Até a falecida monarca seria mais simpática.

Na classe social conhecida como “eu era pobre até ontem e agora rico” não é muito diferente. É a tal história de o dinheiro não comprar bons modos. Ou é o medo que o contato com as origens faça a carruagem virar abóbora de novo. Mudam os amigos, mudam de família e, se pudessem, mudavam até de pai e mãe. Fenômeno parecido acontece também na casta dos “sempre fui rico” ou dos “sou intelectual, não discuto com alguém sem MBA”. O mais engraçado é que essas pessoas realmente acreditam que estão uns três turnos adiantadas na evolução da espécie.

E nem vou insistir em teorias já bem disseminadas na linha do: “o mundo é redondo” ou “aqui se faz, aqui se paga” porque, na verdade, nem sei se este “se paga” procede. Acho que alguns têm a sorte (sorte?) de passar uma vida inteira esbanjando empáfia e esnobando os outros, sem nenhum tipo de retaliação prática.

Mundo estreito

A questão é que, assim como o mundo está ficando pequeno para preconceitos vários, vai ficar cada vez mais intolerante com os sem noção. Aos poucos, vamos assistir a uma seleção natural, que joga na vala comum o povinho rei na barriga e vai abrindo espaço para quem prima pela empatia.

Este efeito dominó começa nas empresas e vai contaminando – no bom sentido – a vida social. São as grandes e boas corporações que já atentaram ao fato de que o cuidado com o outro, a solidariedade e as gentilezas serão valores que deverão pesar na balança na hora de compor seus quadros porque não se ganha jogo só com o atacante estrela e sim com um time coeso, que ataca e defende em bloco.

Porém, como tudo que vem para ficar, trata-se de um processo: ainda teremos que tropeçar em muita gente que “se acha” pelo caminho. Mas o legal é saber que os dias de quem “se acha” estão contados e quem muito “se acha” logo, logo vai acabar se perdendo.

*Wal Reis é jornalista, profissional de comunicação corporativa e escreve sobre comportamento e coisas da vida.

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