Nilson Lattari

Diferenciados, narrativas e outras coisas

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Por Nilson Lattari

Há algum tempo, algumas palavras têm tomado conta do imaginário de personagens que acessam os microfones. Começou com o termo diferenciado, que significa tudo aquilo que é diferente, ou, na melhor das hipóteses, aqueles que realizam coisas diferentes, mas tão diferentes e tão mais além que se tornam diferenciados.

Quer dizer, o diferenciado não é um diferente qualquer, ele é… um diferenciado. Poder-se-ia dizer que o personagem seja um super craque naquilo que realiza, sendo, aliás, bem difundido no terreno futebolístico. O termo se espalhou e tomou conta do imaginário diferenciado de alguns para determinar o mais que diferente, por não acharem adjetivo melhor.

Diferenciado seria um elogio? Foi empregado assim, mas também aqueles que realizam coisas não tão distintas poderiam ser também diferenciados no modo de atuação. Um golpista é um sujeito diferenciado. Ou não? Ou, pelo menos, aqueles que vendem gato por lebre, prometem revelar sua super carteira de investimentos em um ato de extrema benevolência são sujeitos diferenciados. Alguém que ajuda os menos favorecidos nas ruas também é um sujeito diferenciado. O termo serve para o bem ou para o mal. E por que não um sujeito estúpido, que fala tonterias, também não poderia ser um sujeito diferenciado? E não é uma narrativa.

Termo sobejamente utilizado na última CPI, narrativa se tornou uma forma diferenciada de dizer que o sujeito não está agradando com as palavras que profere. Porque fulano é ladrão, corrupto e etc. A resposta segue com o “isso é uma narrativa”. Claro que é! Afinal, está sendo narrada a série de peripécias de alguém. Mas essa narrativa é tratada como falácia. É não mais que um dos processos de argumentação que visa depreciar o oponente, na falta de argumentos.

Suponhamos que alguém foi detido e está diante do delegado, ouvindo as acusações. E a sua resposta seja “Chega dessa narrativa, doutor, é sempre a mesma coisa”. O delegado poderia supor que está diante, realmente, de alguém diferenciado. Afinal como não definir como uma simples narrativa, uma tentativa de homicídio ou latrocínio?

Diferenciado ou não, narrativa ou não, isso me lembra um termo que conheci quando morei lá em Minas Gerais: o sistemático. Não entendia aquilo. “Calma, fulano é muito sistemático, deixe que eu falo com ele”.

Não fui ao dicionário mas aquele termo ficou lá encasquetado. “Que seria um cara sistemático?”. Com o tempo, ao entrar em contato com os sistemáticos me deparei com um padrão. Definitivamente, um sujeito antipático, cheio de manias e é bom lidar com ele cheio de dedos. E é bom mudar o rumo da prosa porque senão a coisa desanda, como eu aprendi por lá.

Enfim, o ciclo se fecha quando dizemos que as pessoas que adotam essas muletas, para dar um rumo na prosa que lhes seja de gosto, poderiam ser sistemáticas. Pessoas, realmente, diferenciadas, porque não é uma narrativa qualquer que pode lidar com elas.

Diferenciado é um personagem mais que diferente e a narrativa é uma maneira de menosprezar o que o outro diz. Todas um zip diferenciado, uma economia de palavras ao agrado de qualquer sujeito sistemático.

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