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( votes)Tenho amigas professoras e outras que são mães de crianças e adolescentes. E o que sei por elas me apavora mais do que ouvir que é prática comum meninos e meninas entre 10 e 15 anos, em média, se lastimarem, se cortarem, arrancarem os próprios cabelos, não comerem ou comerem em demasia, se isolarem e não falarem sobre isso ou sobre absolutamente nada com ninguém. Porque pior do que entender que estas atitudes fazem parte da rotina de jovens mundo a fora é engolir que a maioria dos progenitores prefere fingir que não está acontecendo nada ao invés de encarar que tem uma questão séria de saúde mental ali, que precisa ser resolvida porque, caso contrário, pode acabar muito, mas muito mal.
Não sei se fechar os olhos para isso – mesmo quando a própria escola faz o alerta – se deve ao fato de os transtornos psiquiátricos ainda serem tabu – “coisa de gente maluca e na minha família não tem isso” – ou se é porque os pais não querem sentir que falharam – e muitas vezes não falharam mesmo: algumas patologias da série são congênitas – ou ainda se é por receio de terem que encarar um processo lento e doloroso em forma de tratamento psicológico/psiquiátrico. Um trabalhão para quem imaginava que um filho seria apenas motivo de orgulho.
Fingir cegueira cobra um preço alto para todos os envolvidos e até para a sociedade: quando as manchetes falam sobre psicopatas que atiram nos colegas da escola e ficamos horrorizados, entre as perguntas que surgem: como ninguém percebeu o perigo iminente? Cadê o pai, a mãe deste garoto que não tomou providências? Depois da tragédia abundam relatos sobre comportamentos reclusos e escusos, timidez, sociopatia. Mas tragédias não nascem prontas. Elas são gestadas em cabeças doentias, incapazes de controlar instintos, mas capazes de agir e causar danos irreparáveis para si ou para outros.
A grande maioria dos portadores de transtornos mentais não vai pedir socorro textualmente. Geralmente nem sabe direito o que incomoda tanto. E, às vezes, este incômodo é tão agudo, que o suicídio chega a ser cogitado por eles como analgésico para uma vida que dói. Portanto, se você optou por ter filhos, acompanhá-los passo a passo, colocar limites firmes, ler nas entrelinhas e detectar atitudes fora dos padrões faz parte do manual.
A infância e a adolescência deveriam ser fases felizes e leves, principalmente nas famílias que oferecem conforto e oportunidades. Mas não se trata de ciência exata: qualquer cenário pode ser compatível com transtornos mentais, inclusive os abastados de dinheiro e até de atenção. Não existe uma regra. Por isso só é negligência quando se empurra o problema já instalado para debaixo do tapete.
Quanto antes se admite que há algo errado, quanto antes se busca orientação, maiores são as chances de os pais curarem as feridas na alma de quem não está conseguindo encontrar a saída pelos próprios meios. E é quem dá a vida que tem a obrigação de mostrar que viver é uma aventura que vale a pena.
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