Nilson Lattari

Crônica – “Por onde anda a dor?”

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POR ONDE ANDA A DOR?

Por Nilson Lattari

Como dói a dor de um jogador que se contorce, rolando pelo campo, depois de uma falta “dura, duríssima”, do adversário. Ele pode reagir de várias formas: permanecer com o rosto no chão, rejeitar com palavrões o adversário que vem “consolá-lo” ou então sair lépido e faceiro quando o árbitro, muito bem localizado, se recusa a dar a falta solicitada.

Nos Reality shows, os personagens se contorcem em choros quando se julgam ofendidos pelos outros participantes, ou veem-se envolvidos em uma fofoca na única tentativa de derrubá-los, cochichando falsos segredos, ou apontando as falhas de caráter de fulano ou beltrana.

Tudo faz parte do espetáculo, mesmo o futebol, jogado ao ar livre, como o circo, as festas de rua, ou então aquele outro fechado em recintos onde somente privilegiados podem assistir a totalidade das mazelas que envolvem personagens, meros jogadores em um jogo de cartas marcadas.

No futebol, ainda existem as imprevisibilidades do próprio, essência do jogo, motivo dos gritos e apupos da plateia, ao contrário dos Reality que somente enxergam reações do público nas votações, no melhor estilo de um jogo voraz em busca da celebridade.

O primeiro é um espetáculo, o segundo uma representação, mas nem um nem outro estão isentos da Dor.

O que está em jogo é o sofrimento da plateia, energizada pelas supostas infringências que acometem os personagens, representando aparências inúteis que não levam os próprios a lugar nenhum.

O jogador que se contorce em dores a rolar pelo campo, as indignações de personagens que choram e gritam arvorando a suposta honra atingida não são as maiores dores e atentados à honra que possam existir. São momentos simbólicos em que a plateia pode interagir sobre a Dor, sobre o sofrimento, e saboreiam juntas a busca dessa interação.

Não são as dores e desonras que acometem os povos, nos distantes, geograficamente, lares d’África, ou os atentados pelo mundo, nem mesmo a guerra que nos trazem a Dor.

Essas dores estão distantes, vistas de uma relativa zona de conforto, que não explodem nas poltronas da assistência, muito mais ligada a personagens que possa manipular, seja com vaias, aplausos ou votos pelo telefone e se apresentam apenas nos comportados telejornais, com uma certa monotonia, um desfilar infindável de desastres que nos indignam, mas não trazem a exata dimensão da Dor.

Ninguém sabe ou saberá a Dor que o outro sente e nem por onde ela anda, a não ser que ela venha até nós e doa. A interação com a Dor do jogador que rola, o choro de alguém que sofre à distância ou a dor em quem votamos pelo telefone são as dores do nosso próprio tempo. Somos assistentes e críticos dela como personagem, como se fôssemos para sempre imunes a ela.

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